Home Sports Campeã do UFC e lutadoras contam como é conciliar a vida de mãe com a de atleta de elite de MMA

Campeã do UFC e lutadoras contam como é conciliar a vida de mãe com a de atleta de elite de MMA

by Da Reportagem

Julianna Peña, Mackenzie Dern, Viviane Sucuri, Kinberly Novaes e Shaunna Bannon têm carreiras muito distintas no MMA, mas que se unem por um fator em comum: lidar com a maternidade enquanto seguem carreiras como lutadoras.

As cinco são de origens completamente diferentes e tiveram trajetórias distintas, embora isso não impeça que os problemas existam e, muitas vezes, atrapalhe quem tente enfrentá-los.

Neste Dia das Mães, a ESPN mostra, nas linhas abaixo, que falta de apoio, insegurança financeira e, claro, preconceito são temas recorrentes a mulheres que tentam equilibrar a vida pessoal com a profissional no esporte (embora seja apenas um reflexo de quem também vive fora dele).

A descoberta

À ESPN, todas relataram experiências muito semelhantes na descoberta da gravidez. A maior foi sobre o futuro de suas carreiras, com dúvidas se se seriam capazes de voltar a competir em alto nível e o que mudaria na vida delas dali em diante.

Mackenzie Dern cresceu acompanhando seu pai, Megaton Dias, um dos maiores nomes da história do jiu-jitsu, em competições ao redor do mundo. Como sonho, sempre planejou ter uma criança para repetir a experiência, dessa vez como lutadora. No entanto, a americana filha de brasileiros engravidou sem planejamento, o que tornou a chegada da filha Moa um baque.

“Minha gravidez foi uma surpresa, não era uma coisa planejada. Eu fiquei um pouco, assim, com medo, né? Um pouco com medo porque você pensa ‘como é que vai ser, vou ser mãe solteira’, como é que vai ser todas essas coisas, né?”, relatou.

Destaque no jiu-jitsu, modalidade em que fez história, Mackenzie havia acabado de chegar ao UFC. Tinha sete vitórias em sete lutas em seu cartel, quando teve que interromper a sequência por conta da gestação.

“Engravidei depois da minha segunda luta. Tinha feito duas lutas rapidamente, tipo março e maio, daí eu já engravidei. Então eu estava tipo assim ‘ah, próxima é a Ronda Rousey’, e toda essa essa atenção, a mídia, o dinheiro, né? Tipo, mulher solteira, com 24 anos, com dinheiro, pô, era festa… Eu era atleta minha vida toda, então eu estava tipo curtindo, adorando. Daí, do nada, você fala ‘caraca'”.

Viviane Sucuri também vivia o auge da carreira quando descobriu que estava esperando seu filho Ravi. Então no Invicta, a brasileira estava a beira de uma luta pelo cinturão quando começou a sentir-se mal durante os treinos. Em um exame de rotina, descobriu a gravidez.

“Tinha lutado com a (Alesha) Zappitella e possivelmente já ia disputar o cinturão. Aí fazendo uns exames de rotina, descobri que estava grávida (risos). Estava fazendo dieta, fazendo os treinos e eu comecei a sentir uma queimação muito forte. Já estava de seis semanas, estava bem escondido. Todo mundo me parabenizando e eu em estado de choque”.

Lutando grávida

Descobrir uma gravidez durante a carreira já é um baque para qualquer lutadora. Imagine, então, saber que competiu enquanto esperava uma criança. Foram os casos da brasileira Kinberly Novaes e da irlandesa Shauna Bannon.

“Não tive enjoo. Na verdade, antes dessa luta do Noxii Combat, eu tinha feito uma cirurgia no cotovelo. Tive lesões bem graves. Depois fiz até uma luta de kickboxing, mas numa categoria um pouco acima. Então essa luta do Noxii ia ser a primeira vez que, desde a cirurgia, ia precisar bater os 52kg. Então, sim, senti bastante dificuldade para bater o peso, mas associei a isso, que fazia muito tempo que eu não baixava para 52 quilos”, revelou Kinberly.

“Depois, parando pra pensar, vi que durante a luta parecia que eu estava sentindo mais os golpes. Tipo, tudo. Fiquei meio tonta com alguns golpes que não foram o soco mais forte que eu já levei. Estava com algumas coisas estranhas, mas nada demais”.

play

1:37

Lutadora de MMA, Kinberly Novaes relembra preocupação com saúde do bebê após luta: ‘Fiquei com hematomas’

Brasileira ganhou cinturão sem saber que carregava filho na barriga

A brasileira ainda venceu a luta por decisão unânime. Já a irlandesa ainda estava fazendo combates amadores, entrou em uma disputa de cinturão sem saber que estava grávida – e foi derrotada.

“Eu tinha lutado cinco rounds pelo cinturão do título com Dakota (Ditcheva), e até perdi peso para essa luta. Não me senti bem, mas nunca pensei que estivesse grávida. E então, uma semana após a luta, não sei o que me fez fazer isso, pensei: ‘Vou fazer um teste de gravidez’. Estava com seis semanas e meia”, relatou.

“E então, quando fui lutar, era como se estivesse em modo de sobrevivência. Acho que não estava realmente lutando, era apenas sobrevivência. Não estava seguindo meu plano de jogo, em certas posições, não estava lutando. E, tipo, depois da luta, fiquei muito frustrada porque pensava: ‘O que foi isso?’. Normalmente algo acontece durante a luta, você se machuca ou há algo em segundo plano para o qual você tem respostas, e isso meio que te permite aceitar um pouco melhor. Mas eu não tinha ideia”.

Preocupação com o bebê

Além do caso de Kimberly e Shanon, que lutaram grávidas, os treinamentos são uma preocupação. A intensidade do esporte, os golpes diretos na barriga e todo o castigo físico que o MMA impõe são fatores que fazem as lutadoras terem uma dificuldade extra.

“Quando lutei o Noxii, estava grávida de três meses. Mas falo que o treino é bem pior que a luta. Mas ainda assim, nessa luta em si com a Renata Baldan, um dos pontos fortes dela era justamente joelhada no clinch e eu tomei de fato muitas. Fiquei com alguns hematomas na barriga, de tomar joelhada na barriga e na cintura. Descobri no domingo a gravidez, e na terça-feira anterior o Jackson, que é o pai do Breno, tinha me nocauteado no treino com uma canelada na barriga. Então sim, a gente ficou extremamente preocupado com esses impactos”, revelou Kinberly.

“Como estava treinando, até descobri meio tarde, descobri com quase quatro meses. Queria saber como é que estava, mas logo a médica falou ‘não, está tudo bem, está crescendo bem’. Então já fiquei de boa”, conta Mackenzie Dern.

Dificuldades financeiras

Não importa se você está no topo da pirâmide ou apenas nos primeiros passos no MMA, uma reclamação muito comum entre as lutadoras é a dificuldade de ser vista apenas como atleta. Em um esporte sem salário fixo, boa parte da renda vem de patrocínios, que são atraídos pelo número de seguidores em redes sociais.

E muitas das lutadoras vivem uma realidade de ganhar mais seguidores por conta da vida privada do que pela qualidade como lutadora. Um anúncio de gravidez pode mudar toda essa história, como foi o caso de Mackenzie.

“Quando anunciei que estava grávida, a quantidade de patrocínios que perdi, de fãs, de pessoas que falaram que eu nunca iria voltar… Daí eu vi que realmente é difícil mesmo”, analisou a lutadora.

“Mas foi muito bom também, vi que tinha muitos fãs só homens. Naquela época, não tinha essa noção de, no Instagram, se você tem mais homens que te seguem, se você tem mais mulheres e etc. Ganhei muitas fãs mulheres, que acredito que vão me apoiar até quando eu parar de lutar. Pra ver a jornada, para ver essa coisa de maternidade e não só como uma mulher bonita que está lutando. Foi bom também de ter essa troca de fãs”.

Além de seguidores, Mackenzie teve que lidar com a perda de patrocinadores.

“Acabei, bem ou mal, vivendo de dinheiro guardado. Parei de ganhar dinheiro, perdi os patrocínios, que bem ou mal eram salário, né? Era o dinheiro de todo mês que estava entrando. A gente tem um dinheiro de luta. Quando você luta, você ganha, mas eu não estava lutando e perdi uns patrocínios que naquele momento acharam que eu não combinava com eles”.

Shauna tinha acabado de deixar um emprego fixo para se dedicar 100% ao MMA, quando foi surpreendida com a notícia da gravidez.

“Tinha deixado um emprego em tempo integral na área financeira. Engravidei em fevereiro e tinha deixado o emprego em dezembro porque queria me concentrar na minha carreira profissional, era esse o plano. Então, deixei um emprego em que ganhava muito bem e passei a trabalhar em uma academia. Aceitei um grande corte salarial porque estava perseguindo meus sonhos. Então descobri que estava grávida e meu salário era muito menor”, afirmou a irlandesa.

“No início, não era ótimo, o dinheiro era muito, muito pouco. E então, tive pessoas que me ajudaram, e eu não estaria onde estou hoje se não fosse por elas. Lembro-me de estar muito estressada porque não tinha dinheiro nem para pagar as minhas contas”.

play

1:04

Lutadora do UFC, Shauna Bannon relembra processo de corte de peso durante gravidez: ‘Desmaiei’

Irlandesa enfrentou Dakota Ditcheva ainda como amadora

Mudança de mentalidade

Balancear o lado profissional com as responsabilidades de cuidar de uma vida é um cenário extremamente comum entre as mulheres. Muitas das vezes, o ônus supera o bônus. São horas e horas dedicadas ao trabalho para ter ainda mais trabalho quando chegam em casa.

No entanto, passar a ser responsável por um ser humano faz com que as perspectivas também mudem completamente, como no caso de Mackenzie.

“A gente sozinho consegue passar sufoco se precisar, mas no momento que você vê que outra pessoa está dependendo de você, você quer prover a melhor vida possível para a sua filha. Daí virou a chave. ‘Não posso ficar brincando de lutinha’. Não posso lutar, treinar, mas depois da luta ir para a festa porque ‘não tem problema se eu perder uma ou outra’. Você fala ‘não, quero levar a sério, quero me mostrar'”, relata.

“(Ser mãe) É uma bênção, a melhor coisa do mundo. É a maior motivação que eu tenho na minha vida”.

Viviane Sucuri também segue a mesma linha de pensamento. “Sempre fui focada em buscar meus objetivos, agora esse foco aumentou muito mais porque tem uma pessoinha que depende de mim, né? Então, o que for pra eu buscar para favorecer ele, vou buscar. Então o foco ficou maior. Tanto que eu estou aqui longe dele, para buscar esse objetivo, para dar o melhor para ele”.

Retorno ao octógono

Passada a gravidez e todos os problemas e benefícios que com ela vêm, é chegada a hora de retornar ao octógono. E nenhum exemplo pode ser melhor do que o de Julianna Peña. Primeira lutadora a ser campeã do UFC depois de se tornar mãe, Venezuelan Vixen falou sobre a sensação de superar as dificuldades e conquistar o cinturão.

“Foi muito interessante porque consegui ter a minha mão levantada em sinal de vitória depois de ficar tanto tempo afastada e depois de ter sofrido uma lesão tão grave no joelho. Então pensei: posso vencer novamente, mesmo tendo feito essa cirurgia no joelho. Quando tive um bebê, foi a mesma coisa. Eu pensei: será que consigo vencer depois dessa grande cirurgia abdominal? Será que consigo vencer depois de ter um bebê, quando estou tentando dormir e ela me chuta no rosto ou quando estou tentando dormir e ela quer mamar? Foi algo muito difícil que tive que superar mentalmente. E descobri que a resposta era sim”.

“Essa força materna que dizem que algumas mulheres adquirem depois de ter um filho é verdadeira. Consegui vencer no mais alto nível e tive a ajuda da força da mãe e da minha filha. Quando ganhei o cinturão do UFC, ela tinha quatro anos e estava lá dentro do octógono comigo. E esse é um dos meus momentos mais felizes, ganhar e tê-la ali no meu colo. Sei o quanto ela tem orgulho de mim, e sei que sou um grande exemplo para ela. E para mim, a única coisa em que quero me concentrar é garantir que posso ser a melhor mãe presente e ensinar a ela o que o trabalho árduo e a dedicação podem proporcionar. Ela é a maior bênção e o maior presente que Deus poderia ter me dado”, disse.

Mackenzie Dern também tem o sonho de conquistar o cinturão do UFC após dar a luz. A lutador até cogitou voltar ao jiu-jitsu por ter menos impacto em seu corpo, mas acabou ficando no MMA para “servir de exemplo para a filha Moa”.

“Essa foi uma dúvida que eu tinha, mas eu sou muito teimosa também. Então, falei ‘não, eu vou mostrar que eu consigo voltar, sim’. Até então não tinha campeã mãe, né? A primeira campeã mãe foi a Julianna Peña, depois que minha filha já tinha nascido”, explicou.

“É uma coisa que a gente nunca sabe, posso dar meu 100% por mais cinco anos e nunca conseguir o cinturão. Mas vou tentar e acredito que tenho tudo para conseguir, ainda mais com a ajuda com a minha filha. Acho que se ela não tivesse nascido, eu teria muito menos chance de ganhar o cinturão do que com ela comigo”.

Inspiração para outras mães

Ter que escolher entre a maternidade e a vida profissional é uma questão que atinge praticamente todas as mulheres do planeta. No entanto, as lutadoras são um exemplo de que as duas coisas podem coexistir. E elas esperam servir de inspiração para mães, atletas ou não, que buscam uma vida profissional melhor.

“Quero poder expressar às mulheres que elas são mais fortes do que imaginam. Sabe, eu estava em uma situação que não era saudável mental e emocionalmente para mim. Não era um bom lugar para mim, eu acreditava, criar uma filha em um lar sem amor. Aproveitei a oportunidade para sair e dizer: não vou continuar neste relacionamento só por dizer que estou em um relacionamento. Não vou continuar para dizer que minha filha está em uma casa com dois pais. Vou criar minha filha em um lugar onde eu possa me sentir mentalmente, emocionalmente e fisicamente segura”, comentou Julianna Peña.

“Fiz isso sozinha, e foi uma decisão que escolhi para mim e para minha filha quando ela era apenas um bebê muito, muito pequeno. Muitas dessas mulheres, acho, talvez estejam em situações em que sentem que precisam estar, mas se você se der a confiança de saber que é forte o suficiente para fazer isso sozinha, então você será capaz de ver que sua vida pode ser muito mais satisfatória e feliz. Tenho que ir trabalhar, tenho que limpar a casa, tenho que lavar roupa. Tenho que buscar as crianças. Tenho que levá-las para as aulas de esportes. Eu tenho que fazer meus exercícios, sabe, e tenho que garantir que o jantar esteja na mesa. Tenho que garantir que eles estejam lavados, alimentados e isso e aquilo e aquilo outro. Somos muito mais fortes do que recebemos crédito. E eu só quero poder dizer: sim, você consegue”, finalizou.

Mackenzie Dern também vai no mesmo caminho e se vê “honrada” de inspirar mulheres ao redor do planeta.

“Fico muito, muito feliz de motivar e inspirar outras mulheres. A gente tem que tentar dar o nosso melhor. E a gente vai falhar. Eu erro nos treinos, erro como mãe. Tem dias que não treino bem por estar preocupada que minha filha está doente. Mas a gente é humano, a gente vai errar. Estou sempre aprendendo, eu não sabia ser mãe. Estou tentando fazer do melhor jeito possível”, explicou.

“Tento fazer meu melhor em tudo. Não sou a melhor lutadora, nem a melhor mãe, mas tento fazer o melhor. Se eu conseguir incentivar as meninas e dar essa motivação, é ótimo. Ainda mais em um mundo machista como o do MMA. Não é comum as mulheres saírem na porrada. A gente é vista como mais delicada, mas ali a gente vai para a guerra. É para a minha vida, para a vida da minha filha, a comida, a roupa dela. Vou fazer tudo que preciso por ela”.

play

1:45

Mackenzie Dern se emociona ao comentar apoio da filha durante sua carreira: ‘É muito importante para mim’

Lutadora explica dinâmica de sua família em casa

You may also like

Leave a Comment